domingo, 29 de novembro de 2009

O contemporâneo Prometeu - Por Christina Vidoto



O contemporâneo Prometeu

A presente análise se baseia em dois paradoxos centrais encontrados no filme Frankenstein de Mary Shelley (1994), dirigido por Kenneth Branagh, com o próprio no papel de Victor Frankenstein e Robert De Niro como a criatura. É uma adaptação bem próxima a obra literária original Frankenstein ou o Moderno Prometeu, da escritora britânica Mary Shelley.



O primeiro paradoxo é que Frankenstein foi bem-sucedido ao dar vida a um ser que consegue ser mais humano, em termos de questões internas, do que seu próprio egocêntrico criador. A tragédia de Frankenstein não é fruto do seu excesso de “prometeanismo”, mas de seu próprio erro moral, sua incapacidade de amar o que está fora da ordem natural; ele odiava sua criatura, ficou aterrorizado e fugiu às suas responsabilidades quando se deparou com tamanha monstruosidade.

Já o segundo gira em torno do poder exercido pela humanidade sob a natureza através da ciência e da tecnologia. No entanto, este mito cientificista entra em contradição com o primeiro, pois nada teria acontecido ou não teria tido importância para Doutor. Frankenstein se sua criatura tivesse saído esteticamente bonita nos padrões considerados normais de beleza. Isto é, ao mesmo tempo em que Dr. Frankenstein obteve sucesso ao “dar a luz”, ele foi infeliz pelo monstro que “nasceu”.

Desde que o mundo é mundo, o tempo é o principal vilão do corpo. Com o passar dos anos, o corpo tende a piorar, como se tivesse uma duração determinada. Por conta disso, é notória a busca incessante de mecanismos tecnológicos que conseguem proporcionar uma longa “bateria” a nossa estrutura física e mental.

Trazendo o debate para os dias atuais, o corpo perfeito de hoje seria como uma imagem digitalmente modificada por softwares de edição. Contrariando ao mito de Frankenstein que usou retalhos de corpos mortos, hoje temos a possibilidade de recorrer à biotecnologia, genética, cirurgias plásticas, enfim, é possível recorrer a diversos dispositivos tecnológicos para criar, ou melhor, para modificar aquilo que nos incomoda. A semelhança entre o conto e os padrões contemporâneos está na lógica tecnocientífica, a qual também é presente nos experimentos de Victor Frankenstein.

Esta análise não é de toda apocalíptica. A intenção não é enxovalhar o que a tecnociência pode nos proporcionar, mas criticar a visão do corpo como vitrine compulsória de nossos vícios e virtudes.

Concluímos que a ciência pode ser feita para o bem ao aperfeiçoar alguma parte do corpo que seja deficiente, como já tem acontecido, a exemplo de uma empresa austríaca que acaba de criar um braço artificial controlado pelo cérebro através de sensores nos dedos da prótese.



Matéria no G1 aqui.


Bibliografia utilizada:

JUNIOR, Gonçalo. Enciclopédia dos monstros. Rio de Janeiro: Ediouro, 2008.

Trailer do filme http://www.youtube.com/watch?v=ZV2r4yn1c80

Imdb http://www.imdb.com/title/tt0109836/

Matéria G1 http://g1.globo.com/Noticias/Ciencia/0,,MUL1394665-5603,00-EMPRESA+AUSTRIACA+APRESENTA+BRACO+CONTROLADO+PELO+CEREBRO.html

SHELLEY, Mary. Frankenstein. Rio Grande do Sul: L&PM Pocket, 1997.

SIBILIA, Paula. O Homem Pós-orgânico: Corpo, subjetividade e tecnologias digitais.Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2002.

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