segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Mulher brasileira em primeiro lugar - Por Raphael Cancellier

A mídia é um ambiente onde ideias e conceitos são colocados em evidência para que embates sejam explicitados e se crie um lugar de fala considerado o “discurso verdadeiro”. Nos meios de comunicação, os corpos e as subjetividades são explorados, algumas vezes exibindo modelos a serem seguidos e outras vezes criando estereótipos e clichês, mas que também servem para serem seguidos.
O corpo em evidência, hoje, é aquele “reto”, com algumas curvas retilíneas, mas sem gordura e ainda assim saudável, podendo ou não sofrer alterações cosméticas ou digitais, através dos bisturis reais ou os bisturis de “software”. Essa ditadura do padrão midiático correto molda além dos corpos, mas também a subjetividade, pois ele, além de ser um corpo, é usado para demonstrar as características internas de cada um (corpo magro é sinal de felicidade, bem-estar e saúde).
Esse ideal corporal é o modelo que foi construído com a ideia de um “corpo moderno” (e agora pós moderno) e para que ele seja legitimado, além dos meios de comunicação, tem o aval da ciência e da bioética, que criam o seus discursos através da fala de “qualidade de vida” e de “cuidados com o corpo”.
Porém, esse discurso de qualidade de vida e os corpos que não são corpos “cotidianos” exibidos pela mídia têm lotado os consultórios de psicólogos, as salas de cirurgias plásticas e criando novas patologias, como a bulimia, a anorexia e todo o tipo de peso que são considerados os novos desviantes para quem não encaixa no padrão “saudável” e “comum” da mídia.
‘ Após esse momento explicitado acima, em meio às patologias, à não-aceitação do corpo e à contestação daditadura da beleza, surge hoje um outro discurso, que envolve a aceitação do sujeito como ele é (conceito que pode e vai ser problematizado a seguir). No programa da Hebe Camargo, no SBT, houve um dia de discussão sobre a auto-aceitação, com um time composto por Hebe Camargo, Preta Gil (símbolo da gordinha feliz e que se aceita como é), quatro mulheres que comandam o site/blog “Mulherão”, a cantora de axé Claudia Leitte (que é a considerada de padrão magro e saudável) e uma matéria com fotógrados que fotografam gorinhas, conhecidos como “Plus Size” (apesar do nome ser charmoso, se fir analisado ao pé-da-letra chega a ter um tom preconceituoso.


O site/blog “Mulherão” dirigido por esses quatro mulheres “gordinhas” (e que se aceitam) é um dos mais acessados no momento a respeito desse tema e nele você encontra desde depoimentos de gordinhas que tentaram de tudo para emagrecer, chegaram ao fundo do poço, fizeram analise e hoje são felizes, até dicas de roupas para afinar a silhueta e passar a imagem da mulher ser mais magra. Os fotógrafos “Plus Size” também seguem essa linha, pois além eles dão dicas para que a mulher tire fotos bonitas, como levantar o pescoço para tirar o “papo”, ficar de lado para afinar a barriga. Eles também adimtem fazer o uso do “photoshop”, que transforma hoje qualquer indivíduo em um “modelo perfeito” sem precisar de cortes que fazem sangrar.
No entando, essa matéria do programa e os discursos apresentados não foram bem aproveitados no sentido de dar evidência na mídia ao corpo que foge à regra padrão midiática, mas serviu apenas para reafirmar o preconceito e aos lugares de fala clichês que já são afirmados pela televisão sempre contra os corpos e as subjetividades de indivíduos que vivem à margem do padrão “normal”.
As afirmações e frases de efeito ditas no programa seguiram a linha de “homem gosta é de carne”, “seja uma gordinha feliz”m “anorexia é uma doença, portanto, aceite-se como você é”, “se gostem em primeiro lugar para que os outros gostem de você”, “a brasilieira é gostosa e tem curvas”. Houve até o comentário da Claudia Leitte (a magra) dizendo que “a gordura é m contexto histórico, pois o homem procura a mulher com curvas para que acalente seu filho”. Além desses clichês, que não levaram o debate do corpo que foge à norma padrão a fundo, nota-se que tanto o site quanto as dicas dos fotógrafos buscam estratégias que façam as mulheres aparentarem ser mais magras, ou seja, esse discurso e essa atitude tanto do site quanto do blog vai contra o discurso apresentado pelos mesmos, que é o de “aceite-se como é”. Se for para que o indivíduo se aceite, para quê o uso dessas estratégias para que o corpo aparente ser menor?
Para completar a analise, nota-se também, no programa da Hebe, que as gordinhas convidadas são as consideradas “gordinhas-não-gordinhas”. Aquela “gordinha enorme” ou a “gordinha obesa” não teve espaço no programa, além do discurso das convidadas ser pautado no discurso da bioética de “qualidade de vida”, pois todas elas fizeram questão de deixar claro que malham, fazem dietas e têm uma boa alimentação, ou seja, são gordinhas saudáveis e não gordinhas sedentárias ou as que seguem a linha desviante de hoje, que são as gordinhas “obesas” e “doentes”.
Portanto, o assunto debatido elo programa deve ser problematizado, pois se elas “aceitam seus corpos como eles são”, por que há a necessidade do blog dar dicas de como usar roupa que disfarce a silhueta, dietas e dicas de comidas saudáveis e por que os fotógrafos usam dicas do mesmo estilo e fazem o uso do “photoshop” para tma´bem disfarçar o corpo “real” da modelo?
Essas questões levantadas acima nos mostram que o corpo real do brasileiro e os corpos que não são considerados nem saudáveis, nem normais para a ciência e para o discurso de qualidade de vida (os corpos não-controlados e não-disciplinados) ainda estão longe de ganhar espaço dentro dos meios de comunicação hegemônicos da pós-modernidade, pois o discurso pautado na saúde e no corpo “conservado” ainda estão em vigor e são utilizados como lugares de fala verdadeiros e controladores dos corpos e das subjetividades da grande massa.
Cabe ressaltar e reafirmar sempre que os corpos e as subjetividades são construídos dentro do contexto histórico de cada época (assim como o corpo modelo na época renascença era o corpo “gordinho”) e estão inseridos em estratégias e jogos de poder, os quais se tornam cada vez mais invisíveis aos nossos olhos, mas cada vez mais eficientes, no que tange ao controle e à estratégias de dominação fortemente elaboradas e também invisíveis, no momento marcadas pela legitimação dentro da grande mídia e dos mitos mitos tecnocientíficos que ocupam o lugar de fala dominante, disciplinador e controlador dos corpos e das subjetividades da pós-modernidade.
Para finalizar, vale observar que no programa da Hebe, após as discussões que passaram pelo assunto de uma forma tangente e sem problematização, finalizou o tema com o cantor Benito di Paula, junto de Preta Gil e Claudia Leitte cantando “agora chegou a vez, vou cantar... mulher brasileira em primeiro lugar”, em seguida, a apresentadora Hebe Camargo apontou para as gordinhas do site/blog “Mulherão” e disse: “Essas são as verdadeiras mulheres brasileiras, assim como todas nós. E nós estamos sempre em primeiro lugar no mundo”. (Última relfexão: existe um tipo de corpo e um tipo de subjetividade para o gênero mulher brasileira, seja ela gordinha, magra, meio-termo, obesa, anoréxica? Não seria mais correto trocar a estrofe por mulheres brasileiras, já que os corpos e as subjetividades são múltiplas e podem ser interpretadas e exploradas por diversos tipos de olhar?)



Blog: http://mulherao.wordpress.com/
Plus size: http://www.modelosplussize.com.br/

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