sábado, 5 de dezembro de 2009

Vampiros 2.0 - Por Letícia Costa



Crepúsculo é o primeiro livro da saga que leva este mesmo nome, em inglês Twilight, da escritora americana Stephenie Meyer. Ele fez sucesso no mundo todo, tanto que virou roteiro de cinema. O livro conta a história de Bella Swan uma menina que se muda para uma pequena cidade chamada Forks para morar com o pai depois do segundo casamento de sua mãe. Lá, ela conhece o jovem e misterioso Edward Cullen, por quem se apaixona. Algum tempo depois, ela vem a descobrir que seu amado é na verdade um vampiro.
A primeira vez que Bella o vê com sua família, é assim que os descreve: “Mas não era por nada disso que eu não conseguia desgrudar os olhos deles. Fiquei olhando porque seus rostos, tão diferentes, tão parecidos, eram completa, arrasadora e inumanamente lindos. Eram rostos que não se esperava ver a não ser talvez nas páginas reluzentes de uma revista de moda. Ou pintados por um antigo mestre como a face de um anjo. Era difícil decidir quem era o mais bonito - talvez a loira perfeita, ou o garoto de cabelo cor de bronze.” Todas as jovens que lêem o livro, costumam se apaixonar, assim como a protagonista, pelo personagem Edward. Com a descrição acima não é difícil imaginar o por quê. A beleza deles realmente não é humana, eles não possuem traços corpóreos, mas em nossa sociedade do século XXI não é essa a beleza na qual todos buscam? Belezas assépticas e descarnadas, que não envelhecem, sem apresentar traço de idade. Os vampiros ainda têm a vantagem da imortalidade. Ela também relata que talvez apenas encontrássemos rostos assim em capas de revistas. Porém as fotos encontradas em tais publicações são na verdade fruto de intervenções tecnológicas do famoso programa de edição gráfica Photoshop. São “retratos exemplares da perfeição a ser atingida por todos nós.” No livro, esses seres não humanos conseguem atingir essa perfeição, mas possuem um conflito psicológico: eles se alimentam de sangue. Por não gostarem de matar pessoas, se alimentam de sangue de animais o que é menos atraente. Por isso se consideram “vegetarianos”. Eles não querem ser assassinos, mas ignorar seus instintos é bastante difícil para alguns deles.
Milhares de pessoas em todo o mundo se submetem à diversas intervenções cirúrgicas para atingir o seu ideal de beleza. Passam por todos os processos dolorosos conseqüentes dessas intervenções. Se fossem oferecidas garantias de que todos ficariam lindos e perfeitos, se alimentar de sangue talvez seria um pequeno preço a se pagar por seus objetivos. Citando Paula Sibilia: ”Seus corpos costumam ser mais “perfeitos” do que os organismos biológicos naturais – ou seja: são melhores do que os corpos demasiadamente humanos da maioria de nós.” Imaginando os avanços da biociência e os valores em relação ao corpo de nossa sociedade, se realmente existissem vampiros e suas características fossem as descritas no livro, talvez pílulas para inibir a sede por sangue humano fossem criadas da mesma forma como existem atualmente inibidores da fome.
Outra característica dos personagens não humanos que é considerada uma grande qualidade em nossa sociedade, ligada à questão da aparência, é a riqueza. A família Cullen é extremamente rica. O vampiro além de ser bonito e perfeito possui um Volvo que a escritora descreve como reluzente. No blog alohamara00.blogspot.com, a blogueira Maaria Samara escreveu no dia 10 de março de 2009 “Dane-se o príncipe no cavalo, eu quero é o vampiro no Volvo”. Evidenciando que os valores e os sonhos antigos estão dando lugar à novos.
Os vampiros descritos neste livro são bem diferentes do vampiro mais famoso de todos os tempos: Conde Drácula. Este, criado pelo escritor irlandês Bram Stoker em seu romance de 1897, teve sua última adaptação para o cinema em 1992. No filme, ele muda de aparência diversas vezes, mudando de velho para novo, e de homem para animal, diferente do que se imagina ele se transforma em lobo e não em morcego. Drácula, não se sente culpado em alimentar-se de sangue humano e sofre as mutações para atingir seus objetivos maléficos. Esses novos vampiros do século XXI são versões melhoradas não só dos humanos mas também do que se conhecia como vampiro. Não seriam estes então vampiros 2.0? A junção das melhores qualidades dos vampiros como força, agilidade, imortalidade e beleza com qualidades humanas como a possibilidade de amar.
Talvez por esses aspectos comentados, Crepúsculo é tão bem sucedido. Os vampiros parecem possuir grande parte do que a sociedade atual considera importante como beleza e fortuna. Tais personagens são tão fáceis de se apaixonar quanto de querer ser um deles. Porque com o avanço da biociência atual, questões psicológicas descritas no livro poderão ser facilmente “domadas” com pílulas. A criação de medicamentos existe a partir da sua procura, logo se tais problemas fossem reais acredito que logo seriam resolvidos.



¹Meyer, Stephenie. Crepúsculo Ed. Intrínseca pag. 24
²Sibília, Paula. De Frankenstein a Pigmalião: O “corpo perfeito” como uma obra de cirurgiões e designers

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